Por: Reinaldo Azevedo
Publicada: 18/01/2018
Não há nenhuma novidade na sustentação que a defesa de Lula fará no TRF-4 para tentar derrubar a sentença de Sérgio Moro. Para quem acompanha este blog os comentários que faço aqui, menos ainda. O principal argumento da defesa, note-se, quem deu foi o próprio juiz em resposta aos embargos de declaração. Escrevi a respeito a respeito no dia 19 de julho. No dia 13 daquele mês, já havia apontado os “saltos interpretativos” da sentença.
A denúncia (íntegra aqui) oferecida pelo Ministério Público Federal é clara a mais não poder: afirma, com todas as letras, que os recursos que resultaram no tal tríplex do Guarujá derivaram de três contratos com a Petrobras mantidos por consórcios integrados pela OAS: um para obras na Refinaria Getúlio Vargas-Repar e dois para a Refinaria Abreu e Lima.
Na sentença em que condena Lula (íntegra aqui), com efeito, Sérgio Moro não demonstra os vínculos entre os contratos para tais obras e o dito apartamento. Ora, evidenciá-los parecia a todos coisa obrigatória, uma vez que se trata do crime de corrupção passiva. Ainda que a denúncia vincule os diretores nomeados por Lula com os supostos benefícios indevidos, lá está a acusação formal: tais benefícios teriam saído dos contratos referentes às três obras.
A defesa de Lula, por óbvio, levantou essa questão. Até porque, ao arbitrar a multa, Moro apela justamente aos casos citados pelo Ministério Público Federal. E eis que o juiz deu uma resposta que não deixa de ser surpreendente. Escreveu ele:
“Este juízo jamais afirmou, na sentença ou em lugar algum, que os valores obtidos pela Construtora OAS nos contratos com a Petrobras foram usados para pagamento da vantagem indevida para o ex-Presidente”.
Bem, se a denúncia diz uma coisa e Lula é condenado por outra, algo de grave se deu aí, não é? Mais: ao afirmar que os “valores obtidos pela Construtora OAS nos contratos com a Petrobras [não] foram usados para pagamento da vantagem indevida para o ex-Presidente”, abre-se um outro questionamento, que a defesa também fará: então por que o juiz do caso é Moro se a ele estão afeitas as apurações que dizem respeito a desvios na Petrobras?
Lula foi condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. O primeiro crime supõe que o governante cometa algum ato de ofício, ainda que, vamos dizer, na modalidade “promessa”. Diz o caput do Artigo 317 do Código Penal, que tipifica a corrupção passiva:
“Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:”
Muito bem. Há, então, um pressuposto de que Lula tinha ascendência sobre os diretores da Petrobras — e, no balcão, seriam estes a “solicitar ou a receber vantagens”. A defesa dirá que esses diretores passavam pelo crivo do Conselho da empresa, não de Lula. E há, desde logo, uma questão: se, como quer Moro, os “valores obtidos pela OAS” não foram usados “para pagamento indevido de vantagem”, o que, então, caracteriza a corrupção passiva nessa relação?
A defesa deve concluir que a condenação se baseou, unicamente, na acusação feita por Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS, que, no entanto, apontam os advogados de Lula, não apresentou provas do que disse. Segundo o empresário, havia uma espécie de conta-corrente do PT com a empreiteira, e dali teriam saído os recursos. Ocorre que, com efeito, jamais sugiram evidências materiais dessa conta-corrente.
Bem, meus caros, o que recomendo a vocês? Que leiam a denúncia do MPF e a sentença de Moro. Os links vão acima. E que se lembrem: o objeto dessa ação não é saber se Lula era ou não o chefe máximo do petrolão. Ele foi condenado por ser, segundo a sentença, o dono oculto do imóvel, que teria origem em dinheiro de propina.
Acontece que a Justiça do Distrito Federal penhorou o tríplex, considerando-o um bem da OAS, porque a empreiteira não pagou a dívida com um fornecedor. A ser como quer Moro, a Justiça do DF, então, penhorou um imóvel de Lula para responder a uma dívida da empreiteira.
Vamos ver como a Oitava Turma do TRF-4 vai enfrentar essas questões.
E é bom que vocês saibam: não há um só advogado ou jurista de peso entusiasmados com a sentença de Sérgio Moro. Ao contrário: a esmagadora maioria dos especialistas considera que ela é fraca, confusa e prolixa. Mas, obviamente, ninguém dá a cara ao tapa. Avaliam que o juiz, ao ignorar a denúncia feita, praticamente admitiu a inexistência das provas.
Reitere-se: não se trata de “achar” se o apartamento pertence a Lula ou não. Eu até posso achar que sim. E daí? O Ministério Público Federal precisa apresentar a prova. Moro acha que isso aconteceu. Ocorre que, para chegar a essa conclusão, ele teve de ignorar o conteúdo da denúncia e se ancorar exclusivamente na acusação feita por Léo Pinheiro, que negociava, à época, um segundo acordo de delação premiada.
Não custa lembrar: ele já havia feito um primeiro acordo em 2016, em que Lula não figurava como acusado. Janot jogou a delação no lixo. E, até hoje, ninguém sabe por quê.
Para manter a sentença, o TRF-4 terá de dar algumas respostas que, até agora, ninguém deu.
“Este juízo jamais afirmou, na sentença ou em lugar algum, que os valores obtidos pela Construtora OAS nos contratos com a Petrobras foram usados para pagamento da vantagem indevida para o ex-Presidente”.
“Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem:”
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