Ele é um pacote microscópico de material
genético envolto por uma camada de proteína com um milésimo do tamanho de um
fio de cabelo humano.
No entanto, esse vírus letal, chamado Sars-CoV-2, se espalhou por
quase todos os países do mundo e infectou quase 800 mil pessoas desde que foi
identificado em dezembro de 2019 na China.
Vírus como este, da família dos coronavírus, podem causar doenças
em animais. Sete deles, incluindo o Sars-CoV-2, saltaram para humanos de outros
animais e foram responsáveis por pandemias como a Síndrome Respiratória Aguda
Grave (Sars) e a Síndrome Respiratória do Oriente Médio (Mers).
Mas os especialistas afirmam que nunca viram um patógeno tão
traiçoeiro quanto esse novo coronavírus, incluindo até mesmo o ebola.
E o que faz com que o Sars-CoV-2 ataque as células humanas e se
espalhe com tanta eficiência?
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Entrada na célula
Diversos pesquisadores no mundo estão investigando quais são os
mecanismos biológicos que o vírus utiliza para infectar tão facilmente as
células humanas.
Alguns estudos focam as espículas na superfície do vírus,
estruturas proteicas em forma de pontas que compõem uma espécie de coroa (daí o
nome corona, que é coroa em latim).
Outros pesquisadores estão estudando a "porta de entrada"
que o vírus utiliza para adentrar as células humanas.
O principal objetivo do vírus, depois que
entra no organismo, é criar cópias de si mesmo. E para isso precisa encontrar
uma forma de adentrar as células.
"Os vírus dos resfriados comuns, da Sars e da Mers, todos têm
espículas, e o que determina como elas adentrarão as células é qual o receptor
utilizado para isso", explica Panagis Galiatsatos, professor de medicina
pulmonar e cuidados intensivos da Faculdade de Medicina da Universidade Johns
Hopkins, nos Estados Unidos, em entrevista à BBC News Mundo, o serviço em
espanhol da BBC.
Estudos têm apontado que o Sars-CoV-2 se aproveita de um receptor
específico chamado ACE2 (enzima conversora da angiotensina-2).
Essa proteína aparece em diversas partes do corpo, como pulmões,
coração, rins e intestino, e sua principal função é reduzir a pressão arterial.
"A ACE2 está na superfície da célula, e quando o vírus a
reconhece, adere a ela e entra na célula", afirma Sarah Gilbert,
professora de imunologia da Universidade Oxford, no Reino Unido.
"Ali dentro, o vírus utiliza todo o maquinário celular como
uma fábrica para fazer cópias de si mesmo e de seu material genético. Depois
escapa da célula, da qual resta apenas a casca, e o vírus, com suas milhares de
cópias, está pronto para começar a infectar outras células."
Os vírus respiratórios, como o do resfriado comum, tendem a se
reproduzir no nariz e na garganta, de onde podem ser facilmente espalhados por
meio de tosse ou espirro.
Mas há outros vírus que só se reproduzem no trato respiratório
inferior, principalmente nos pulmões, de onde são menos transmissíveis, porém
mais perigosos.
Característica crucial
O Sars-CoV-2 tende a ter uma característica crucial: ele se
encontra tanto no trato respiratório superior, propagando-se facilmente, quanto
no inferior, produzindo uma enfermidade nos pulmões que pode ser fatal.
© Getty
"O que mais nos preocupa é que esses
receptores ACE2 estão presentes também nas células dos alvéolos, os delicados
sacos de ar nos pulmões onde ocorrem as trocas de gases", explica
Galiatsatos, da Universidade Johns Hopkins.
Quando o vírus ataca essas células, surge um dos sintomas mais
comuns da covid-19: a dificuldade de respirar e a tosse, que ocorre quando os
pulmões tentam se livrar da infecção.
Falta e desenvolvimento de imunidade
Um novo vírus como este é perigoso não apenas por não termos
medicamentos ou vacinas para nos proteger, mas também porque nossas defesas
naturais não estão preparadas para combatê-lo.
"Como não temos uma proteção natural, todas as pessoas estão
suscetíveis a serem infectadas, e esse é um dos motivos pelos quais ele tem
maior propensão de se espalhar", diz o infectologista Estevão Portela,
vice-diretor de serviços clínicos do Instituto Nacional de Infectologia Evandro
Chagas.
Diante de uma nova ameaça, o corpo tem de partir do zero e
construir as defesas necessárias. Mas, no caso de um vírus, este processo
costuma ser mais demorado do que a velocidade com que este tipo de
microrganismo se multiplica e infecta células.
Quando um invasor é agressivo, resistente ou está presente em maior
quantidade, isso exige outro tipo de reação do organismo, uma resposta imune
adquirida desenvolvida pelo corpo após entrar em contato com um patógeno.
Ela envolve a ação dos linfócitos, células especializadas capazes
de combater microrganismos e de nos proteger da mesma ameaça por mais tempo.
Os linfócitos ficam armazenados em órgãos como os linfonodos e o
baço, à espera de sinais de que devem entrar em ação.
Um dos principais alertas é dado pelos macrófagos, que capturam um
microrganismo ou parte dele e o transporta até os linfócitos, dando início à
resposta imune adquirida.
"Os macrófagos atuam como uma ponte entre as duas respostas
imunes", explica Renato Astray, pesquisador do Instituto Butantan.
Os linfócitos começam então a produzir milhões de cópias de si
mesmos e reforçam o sistema imunológico ao gerar anticorpos, proteínas capazes
de neutralizar um patógeno. Os anticorpos têm a capacidade de reconhecerem e se
ligarem ao invasor, impedindo que ele infecte novas células e se reproduza.
Os linfócitos também marcam alvos para neutrófilos e macrófagos.
"Os linfócitos são como maestros do sistema imunológico, ao fazer com que
as células imunes se aglutinem em torno de uma ameaça", diz Portela.
Ao final deste processo, a maioria dos
linfócitos é destruída, mas alguns se diferenciam e permanecem em nosso corpo
por vários anos, formando uma memória imunológica que tornará mais ágil o
combate ao patógeno se ele nos infectar novamente.
Sintomas e infecção
Uma das principais diferenças do Sars-CoV-2 em relação a outros
dois coronavírus, que causaram a Sars e a Mers, é que esses dois últimos
aderiam a muitos mais receptores celulares e, por isso, se reproduziam mais
rápido.
Isso fazia com que os sintomas da Sars e da Mers aparecessem muito
mais rápido e, portanto, os pacientes poderiam se isolar antes de provocar
tantas infecções.
No novo coronavírus, que parece mais adaptado a se espalhar, os
sintomas não aparecem de imediato ou podem nem aparecer, mas o vírus pode ser
transmitido mesmo assim.
"Acreditamos que uma pessoas pode começar a infectar as outras
pessoas até um dia antes de surgirem os sintomas e por até sete dias depois
disso", afirma David Hymann, especialista de doenças infecciosas
responsável pela estratégia da Organização Mundial da Saúde (OMS) durante a
epidemia de Sars.
Aqui reside o verdadeiro perigo do Sars-CoV-2, e é por isso que as
autoridades ao redor do mundo colocam tanta ênfase nas medidas de
distanciamento social.
O vírus só pode sobreviver se encontra um novo hospedeiro para
infectar. Quando uma pessoa fica em casa durante 14 dias, elimina a
possibilidade de transmitir o vírus para os outros.
"Até o momento, se isolar é a única coisa que podemos fazer.
Estamos tentando encontrar uma vacina ou um remédio que funcione, mas a
velocidade da ciência não é tão rápida quanto gostaríamos, e tudo isso toma
muito tempo", diz Galiatsatos, da Universidade Johns Hopkins.
"No livro A Arte da Guerra, Sun Tzu
afirma que para ganhar a batalha precisamos conhecer o inimigo. Mas quando se
dá conta de quão incrivelmente ardiloso é seu inimigo, isso é uma lição de
humildade. E é isso que eu diria sobre esse vírus."
Fonte: https://www.msn.com/
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