Não serão os eleitores
polarizados que vão definir o futuro presidente
Jair
Bolsonaro e Luiz Inácio Lula da Silva deveriam, se possível, combinar o jogo
político para não dar espaço a que outro pré-candidato à Presidência surja
entre os dois. Como já disse, a polarização entre ambos é relativamente
previsível e confortável para eles. A política, contudo, supera a ficção. Tudo
pode acontecer e o acaso sempre dá as caras, seja para confirmar tendências, seja
para demoli-las. Existem inúmeras variáveis no caminho que leva à corrida
sucessória de 2022. Mas é fácil mostrar que tanto Bolsonaro quanto Lula têm
muito mais popularidade do que qualquer outro aspirante a Presidência da
República
Bolsonaro
tem a seu favor a máquina estatal e, em certa medida, o apoio da maioria do
Centrão. Conta também com uma base de fanáticos que se mobiliza em prol do
líder quando chamada. Lula, pelo seu lado, mantém um recall dos seus bons
tempos de gestão e a estrutura das esquerdas, o que envolve sindicatos e
corporações, além da máquina do PT, mesmo enfraquecida. Para melhorar seu
perfil, aparece como vítima dos excessos da Operação Lava-Jato. Ambos, porém,
correm com mochilas carregadas de problemas. Bolsonaro disputará a reeleição
com o peso do luto das centenas de milhares de mortos pela Covid-19. Lula
enfrentará o peso das estripulias do seu mundo diante das investigações da
Lava-Jato e cercanias. Do mesmo modo que muita gente não se esquece dos fatores
positivos dos governos petistas muita gente não se esquece da corrupção nessas
gestões, fartamente documentada.
Assim, o
que é fácil para Lula e Bolsonaro não se transformará automaticamente em
vantagem eleitoral para eles sem o preço nem o risco do enfrentamento de seus
próprios fantasmas. Bolsonaro ainda poderá reduzir seu passivo apresentando
crescimento econômico e oferecendo vacinação em massa. Lula terá de buscar
narrativas criativas para reduzir a elevada rejeição em torno de seu nome. No
limite, as eleições presidenciais serão decididas pela rejeição: o mais
rejeitado perde a disputa, numa espécie de “paredão do ódio”. Sendo uma disputa
negativa, ambos deveriam estar tratando de reduzir seus respectivos passivos
com os eleitores que não se identificam nem com os bolsonaristas nem com os
lulistas. Pois são eles, os chamados pejorativamente de “ïsentões”, que
decidirão o pleito.
Seria
mais fácil se Bolsonaro e Lula se convencessem disso. Hoje, os dois estão
interessados em falar somente para os convertidos, apostando na debilidade
política dos eleitores de centro. No entanto, o contingente do eleitorado que
não quer nem Lula nem Bolsonaro no Palácio do Planalto é expressivo. Os
candidatos do centro vão disputar uma espécie de play-off para saber se terão
condições de barrar um dos dois favoritos e chegar ao segundo turno. Para
evitar que a polarização agora predominante se rompa, Bolsonaro e Lula terão de
ampliar o alcance de suas narrativas. Será o único caminho para impedir que o
centro consiga uma vaga no segundo turno. Na vida e nas campanhas eleitorais,
amores e simpatias podem se transformar e mudar de lado. O ambiente econômico,
a intensidade do noticiário e as redes sociais podem afetar os humores do
eleitorado. Entretanto, considerando o quadro atual e suas tendências, a
polarização deve prevalecer. Mas não serão os eleitores “polarizados” que vão
definir o futuro presidente.
Publicado
em VEJA de 9 de junho de 2021, edição nº 2741
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