"Eu vou botar a mão nesta taça". Com esta frase, dita à Folha uma
hora depois de anunciar sua surpreende aliança com Marina Silva,
Eduardo Campos definiu seu êxtase com o passaporte premiado que
acreditava ter acabado de conquistar naquele 5 de outubro de 2013.
Pai de cinco filhos e neto de Miguel Arraes (1916-2005), um dos símbolos
da oposição à ditadura militar, Eduardo Henrique Accioly Campos
completou 49 anos no último domingo (10), dia dos pais, desejando que seu presente viesse das urnas, em outubro.
Ex-governador de Pernambuco por duas vezes (2007-2014), fazia política
no fio da lâmina que separa os polos ideológicos. Integrante de uma
família que se associou aos comunistas na década de 1960, casou-se com
uma mulher que tem raízes nas oligarquias nordestinas.
Campos dizia não ver contradição nessas oposições, a começar pelos
próprios pais. Nascido em Recife, em 10 de agosto de 1965, era filho de
Maximiliano Campos, um fazendeiro tradicional, poeta e escritor, e de
Ana Arraes, que vivia entre militantes de esquerda por causa do pai.
"Nasci numa família de perseguidos políticos. Fui gerado e, dias depois, minha mãe fugia da polícia", disse Campos, no ano passado, em uma viagem de avião acompanhada pela Folha.
Do avô, herdou a capacidade de transitar entre os opostos. Arraes era
considerado coronel de esquerda, que se associou a forças conservadoras
após volta do exílio, em 1979. Quando Arraes morreu, em 2005, há exatos
nove anos, o ex-presidente Lula rapidamente se transformou na referência
política do jovem pernambucano.
O petista o tratava como pupilo e, com ele, trocava confidências. Foi por suas mãos que Campos se tornou ministro da Ciência e Tecnologia
(2004-2005), saindo do cargo para retomar seu mandato na Câmara dos
Deputados e, assim, integrar a tropa de choque que tentava conter a
crise do mensalão.
"Na minha relação com Lula ninguém mexe. Nós sabemos o que nos une", afirmou, enigmático, depois de romper com
Dilma Rousseff no ano passado, afastando seu partido da base aliada ao
Palácio do Planalto mesmo contra a vontade do "padrinho".
Àquela altura, ele já não escondia a ambição de concorrer contra Dilma.
A ruptura entre PSB e PT começou a se desenhar após Dilma dar sinais de
que não daria ao PSB –partido que havia navegado na órbita petista nas
últimas décadas– o espaço que o partido julgava merecer na coalizão.
Com gestões bem avaliadas em Pernambuco, Campos liderava uma legenda que
vinha crescendo a cada eleição e que em 2012 havia sido adversária do
PT em várias cidades, inclusive Recife. Em seu reduto, Campos aplicou
derrota histórica ao petismo.
Agora, Campos estava determinado a furar a polarização dos últimos 20 anos entre PT e PSDB.
Cultivava proximidade com movimentos sociais ao mesmo tempo em que investia em alianças com conservadores pelo sonho de chegar ao Planalto.
Foi de olho na sucessão que abriu as portas do PSB para ícones do velho
PFL. Em Pernambuco, seu palanque teria Severino Cavalcanti e Inocêncio
Oliveira, símbolos da "velha política" que ele prometia combater.
Pesavam contra Campos acusações de nepotismo, por indicar parentes a cargos no governo e no Tribunal de Contas
do Estado. Outro episódio polêmico envolvendo familiares foi seu
empenho para eleger a mãe como ministra do TCU (Tribunal de Contas da
União), em 2010.
Talentoso operador político, atraía a atenção pelo bom humor e articulação. Fazia imitações de Lula e Dilma e adorava contar causos.
Dedicado às articulações eleitorais, dormia apenas quatro horas por
noite. Era seriamente alérgico a camarão, a ponto de sua assessoria
carregar na mala, durante as viagens de campanha, uma injeção para
coibir reações. A precaução veio após o pernambucano quase morrer de um
ataque anos atrás.
Dono de uma personalidade forte, não gostava de ser contrariado, mas
respeitava mais quem assim o fizesse. Renata, sua mulher, era a quem
mais ouvia. Ele a conhecia desde os 6 anos, e por ela se apaixonou já na
adolescência. Pai de Maria Eduarda, 21, João, 19, Pedro, 17, José, 8, e
do bebê Miguel, de 6 meses, Campos consultava a família para tudo.
Nas últimas semanas, a convicção sobre levantar a "taça" em outubro
exibia sinais de abalo, mas nunca desapareceu. A ansiedade por não
crescer nas pesquisas só diminuiu na véspera de sua morte, quando saiu
de entrevistas na Globo com um sorriso enorme.
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