Após quase cinco horas de discussão e bate-bocas, o Conselho de Ética adiou para esta quarta-feira (8) a votação do relatório que pede a cassação do mandato de Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que já está afastado do comando da Câmara desde o dia 5 de maio.
A decisão foi anunciada pelo presidente do Conselho, José Carlos Araújo (PR-BA), a pedido do relator, Marcos Rogério (DEM-RO), ambos adversários de Cunha, diante da constatação de que Cunha seria absolvido caso a votação ocorresse nesta terça-feira.
Considerada voto decisivo, a deputada Tia Eron (BA), do PRB de Celso Russomanno e Marcelo Crivella, não apareceu na sessão, o que abriria margem para o voto do suplente Carlos Marun (PMDB-MS), um dos principais defensores de Cunha.
O placar no Conselho ficaria 11 a 9 para salvar Cunha. O "sumiço" de Eron monopolizou o final da sessão, com clara interpretação por deputados de que ela e o PRB acertaram livrar Cunha da cassação.
O processo contra o peemedebista já é o mais longo da história do Conselho. Em seu parecer, Rogério afirma que Cunha quebrou o decoro parlamentar aoomitir a existência de contas no exterior que, segundo a Procuradoria-Geral da República, foram abastecidas em parte com dinheiro do petrolão.
Qualquer que seja a decisão do Conselho, Cunha só perderá o mandato caso pelo menos 257 dos seus 512 colegas se manifestem nesse sentido, em votação aberta no plenário da Câmara. Ainda não há data marcada para essa definição.
A representação contra Cunha foi apresentada na Câmara pelo PSOL e pela Rede em 13 de outubro de 2015.
Alan Marques/Folhapress | ||
Exaltado, o deputado Wladimir Costa (SD-PA) discute na Câmara |
Apesar de Cunha ser hoje réu, denunciado e alvo de inquéritos e de pedidos de inquérito sob a acusação de integrar o petrolão, as investigações do Conselho acabaram se concentrando quase que exclusivamente na afirmação de que ele mentiu aos seus pares em depoimento espontâneo à CPI da Petrobras. Na ocasião, março de 2015, ele negou ter "qualquer tipo" de contas no exterior.
A limitação da investigação se deu principalmente pela ação de aliados e do próprio Cunha, que até o início do mês passado presidiu a Câmara com grande ascendência sobre seus pares.
As manobras acabaram levando o Supremo Tribunal Federal a decidir, por unanimidade, afastá-lo de suas funções no dia 5 de maio sob o argumento de que sua permanência à frente de uma das casas do Legislativo era deletéria para as investigações da Lava Jato e do Conselho de Ética.
Entre as manobras que levaram o atual processo a ser o mais longo da história estão a destituição do relator inicial do caso e a anulação da primeira votação preliminar em decisões tomadas pelo presidente interino da Casa, Waldir Maranhão (PP-MA), também apoiador de Cunha. Maranhão também foi o responsável por proibir o Conselho de ampliar o rol de acusações contra o peemedebista.
Alan Marques/Folhapress | ||
O presidente do Conselho de Ética, José Carlos Araújo (PR-BA, à esq.), e o relator Marcos Rogério ((DEM-RO, à dir.) na sessão |
PRÓXIMOS PASSOS
Qualquer que seja a decisão desta quarta, o desfecho desse caso ainda é uma incógnita. Caso perca no Conselho, Cunha deverá recorrer à Comissão de Constituição e Justiça, a principal da Casa, para tentar anular a votação. O argumento é o de que o Conselho praticou variados atentados processuais durante a tramitação do caso.
Há ainda sob a mesa de Maranhão a análise de recursos para igualmente anular o trabalho do Conselho.
Um terceiro flanco será o de tentar aprovar no plenário da Câmara a aprovação de uma punição mais branda, como a suspensão do mandato.
Para isso, aliados contam com a alteração das regras para cassação dos mandatos. Por iniciativa de Maranhão, a CCJ deve votar nos próximos dias parecer que, entre outras coisas, permitirá a apresentação de emendas ao relatório aprovado pelo Conselho de Ética durante a votação no plenário.
Aliados ainda tentam convencer Cunha a renunciar à presidência da Câmara como forma de dar aos deputados argumento para votar a favor de uma punição mais branda.
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Manobras de Cunha e aliados
1 - A representação contra Cunha deu entrada na Câmara em 13 de outubro de 2015. Já é o processo mais longo da história da Casa.
2 - Comandada por Cunha, a Mesa da Câmara levou 14 dias, prazo máximo possível, para realizar a mera tarefa burocrática de numerar a representação e a enviar ao Conselho de Ética.
3 - O primeiro relator do caso, Fausto Pinato (PP-SP), foi afastado por decisão de Waldir Maranhão (PP-MA), em resposta a recurso de aliados de Cunha, sob o argumento de que ele fez parte do mesmo bloco partidário de Cunha, o que o impediria de relatar o caso.
4 - A primeira votação que decidiu dar continuidade à investigação, em dezembro, também foi anulada por Maranhão, sob o argumento de que foi negado irregularmente pedido de vista do relatório.
5 - Devido à ação protelatória de aliados, essa votação –que é inicial, apenas decide se há ou não elementos mínimos para a investigação– só conseguiu ser refeita no início de março, quase cinco meses depois da apresentação da denúncia.
6 - Em 9 de março, a Folha revelou que a tentativa de enterrar o processo de Cunha envolveu a falsificação da assinatura do deputado Vinícius Gurgel (PR-AP), que posteriormente renunciou à sua vaga no colegiado
7 - Na votação do relatório inicial, excluiu-se, por pressão de seus aliados, a acusação de que Cunha recebeu propina do petrolão.
8 - No final de março, Cunha tentou aprovar mudança de regras para aumentar a vaga de aliados no Conselho de Ética. A divulgação da manobra e a reação contrária o fizeram recuar.
9 - Desde março, partidos aliados a Cunha promoveram troca de deputados no Conselho, mudanças importantes já que o prosseguimento da investigação contra Cunha se deu por apenas 1 voto (11 a 10). Entre outras mudanças, saiu o deputado Fausto Pinato (PP-SP), que era do PRB e votou contra Cunha, e entrou a deputada Tia Eron (PRB-BA), que segundo aliados do peemedebista votaria a seu favor.
10 - Em mais uma decisão favorável a Cunha, Waldir Maranhão proibiu o Conselho de retomar a acusação de recebimento de propina, sob pena de nulidade do processo.
11 - Maranhão enviou à CCJ consulta para mudar as regras de cassação. Aliado de Cunha, Arthur Lira pediu para si a relatoria do caso, segundo o presidente da CCJ, Osmar Serraglio (PMDB-PR), e deu parecer nesta segunda (7) favorável às mudanças benéficas ao presidente afastado da Câmara.
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