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Lula busca nova relação com Congresso e tropeça em velho dilema: ceder sem virar refém do fisiologismo

 

História por Raquel Miura

Enquanto esbraveja contra os juros, presidente tenta nos bastidores construir base para votação de propostas no Congresso. O desafio é ceder sem virar refém do fisiologismo, fugindo de uma relação que já deixou marcas pesadas no PT.

Num depoimento à Lava Jato há nove anos, o doleiro Alberto Youssef disse que parlamentares paralisaram o Congresso por quase cem dias em 2004 em forma de pressão para que o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva nomeasse Paulo Roberto Costa para a Diretoria de Refino e Abastecimento da Petrobrás. E assim acabou acontecendo. Já falecido, Costa tinha apoio de vários partidos, especialmente o centrão, mas também da oposição.

 

Os fatos que vieram depois daquela pressão de congressistas são conhecidos. Lula conquistou a reeleição, terminou o segundo mandato com alto índice de aprovação, com o PIB em alta, juros baixos e conseguiu fazer sua sucessora. Mas a relação com o Congresso também deixou marcas que o PT carrega consigo, como denúncias de corrupção. E as tortuosas lembranças de que a dependência de uma base parlamentar fortaleceu o líder do MDB na época, Eduardo Cunha, que virou algoz de Dilma Rousseff no impeachment.

O momento hoje é outro, mas aspirações de poder e dinheiro continuam pautando a relação com o Congresso, onde a base fiel à Lula é menor. Por sua vez, os desafios econômicos são imensos e todos sabem que destravar o crescimento econômico é a condição básica para se pensar num projeto de médio prazo. Não à toa, Lula já demonstrou certo desânimo e chegou a dizer que em política ‘se faz o que se pode’.

Disputa política

A paralisia atual, que já deixa na fila de espera MPs importantes como a do Bolsa Família, tem como pano de fundo a discussão sobre o trâmite de Medidas Provisórias, mas vai muito além de um debate sobre os regimentos internos do Congresso. No rearranjo de forças pós-derrota de Bolsonaro, o Senado de Rodrigo Pacheco tenta garantir seu lugar ao sol de olho nos frutos agora e também em 2026, enquanto a Câmara de Arthur Lira garimpa meios de se manter protagonista no jogo político, incluindo aí o domínio sobre parte relevante do orçamento.

“Ao longo dos últimos anos foi se construindo um padrão de relação entre Congresso e Executivo que visou garantir verbas públicas para alimentar 513 deputados e 81 senadores, que acabam funcionando como empresas individuais. Um modelo que na ponta impediu a realização de política com P maiúsculo, que virou entrave à solução dos problemas reais da população”, disse à RFI o advogado e cientista político Melillo Diniz, do Movimento e Combate à Corrupção Eleitoral.

O governo Lula já deu mostras que vai negociar. A pergunta é se terá estratégia e capacidade para impor limites. Ministro acusado de usar verbas públicas em viagens foi mantido no cargo, assim como foi preservada uma ministra supostamente ligada a milícias. Também chamou a atenção o modelo de distribuição de recursos orçamentários herdados ainda do orçamento secreto, onde já há quem veja brechas para não identificar o político e apenas a prefeitura que irá receber o dinheiro. Aliados mais próximos avaliam ser possível construir uma base mais consistente, com siglas que foram bolsonaristas, como o próprio PP de Lira. Mas não arriscam o preço.

“Uma imposição de forças que acaba por relativizar a qualidade da política e insistir nesse padrão que tende à corrupção e à negociata. É por causa desse modelo que estamos enterrados até o pescoço numa realidade que não avança nas questões que interessam de fato ao país. O governo vai ter que encontrar um outro jeito de fazer política. Os primeiros momentos dessa nova possibilidade de relação, que eu não acredito, teremos com a votação do arcabouço fiscal e a reforma tributária.”, disse Diniz.

Nova relação com o Congresso

Lula tem criticado publicamente a manutenção dos juros altos, que dificultam o crédito, impedem a expansão econômica e explodem a dívida pública. Mas não apenas no Banco Central residem os entraves para tirar do papel promessas de campanha. Só que esbravejar contra algumas figuras de outro poder sai caro demais no ambiente político.

No meio dessa busca por uma nova relação com o Congresso, Lula pesa inclusive quando enviará propostas polêmicas, e podem lhe exigir muita negociação extra, como a nova indicação para o Supremo Tribunal Federal. Lula já conhecia os espinhos das negociações políticas. Parecia disposto e animado a enfrentá-las após a derrota do arquirrival Bolsonaro e depois dos dias em que passou preso. Ele já demonstrou certo cansaço, mas tem dito também a interlocutores que continuará tentando.


Fonte: https://www.msn.com/

 

 

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